sexta-feira, 2 de julho de 2010

Mariana e o Arcanjo

Para Cate e seu anjo. Promessa cumprida.
Mariana e o Arcanjo
-
Era um dorsel negro
pontilhado por diamantes, o céu
ao qual ela mirava, ajoelhada
Pedindo aos Céus
que lhe completassem, com a peça que faltava
-
Pensava a dama que estava surdo
Aquele a quem rogava
mas, inesperado, surgiu
Um dia, incandescente do céu
O Arcanjo que lhe tomou o coração
-
Nunca mais foi a mesma desde então,
Viu-se arrebatada num extâse do amor transcedental
Um amor que rugia no peito,
espalhava-se pela alma
e lhe preenchia a mente
-
O desejo lhe fora atendido,
mas ela não sabia como atrair para si
O olhar daquele que a mesmerizava
-
Como, uma mera mulher em carne e osso,
faria-se notar em meio às constelações
aos planetas e aos sóis que ele fitava?
Como atrair o olhar daquele que amava?
-
Então, anuviada, Mariana continuava a olhar o céu
Era grande, belo, estrelado
E bem ao meio, como uma incandescente luz
Que lhe preenchia a alma,
Lá etava o Arcanjo pelo qual se enamorara
-
Ele era tão belo
Quando sonhava com ele,
ao fitar em seus olhos negros
- que olhos! Duas poças do mistério da existência! -
Ela via mil céus, enumeras luas e
Abrasadoras estrelas que lhe arrematavam
ao infinito...
-
Mas, oh Deus, ele estava tão longe...
Ele era sonho,
evanescência dourada do delírio dela
Que só podia orar e orar
Pobre donzela em flor... Em prantos e em dor...
-
Tal amor intangível
Pelo seu Eros incrustado
Na luz da sabedoria
Cheio de beleza e bondade
E tão longíquo... Doce sonho perdido,
na curva da eternidade
-
Mas um dia, o Arcanjo a olhou
E disse "tua alma é cristalina, pura donzela
e que lábios são estes? Tão rubros,
vermelhos como a alma de uma orquídea...".
Sim, ele dissera! Falara a ela, a pobre moça
que pelo impossível se apaixonara
-
E Mariana está a rogar, constantemente
para sempre
E ninguém sabe o que acontecerá,
mas há qualquer momento, outra vez
o Arcanjo pode, para ela, olhar
E, então, se encantar.

Um poema sobre o amor

“E sou, talvez, na noite voluptuosa, ó meu Poeta, o beijo que procuras!”

Florbela Espanca



“Não há ninguém, mesmo sem cultura, que não se torne poeta quando o Amor toma conta dele.”

Platão







ao Orfeu Rebelde

Um poema sobre o amor

-


Os olhos, o sorriso,

são coisas efêmeras,

mas que superam o toque,

as carícias, o sexo

-

São pequenos e descartáveis,

para os outros, mas para mim,

desvalam na Eternidade

Por que o amor é Essência

-

O amor é a busca da alma,

filosofia entre carnes,

é conhecimento entre suspiros,

é a Plenitude,

O amor é a imortalidade,

através da anistia da Existência…

-

Repleto de aromas, imagens

e momentos que podem ser

dos melhores sabores

ou piores dissabores

mas serão lembrados sempre

com a nostalgia da alma,

-

Por que, realmente,

O amor é a fuga do vazio,

para o Eterno.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Sobre Orfeu

Sobre Orfeu
-
Se me perguntares
De que cor são teus olhos
Direi apenas que eles são
Duas poças negras que guardam o infinito
-
Se me perguntares
De que cor são teus cabelos
Direi apenas que eles são
Mais escuros e belos que o céu de fevereiro
-
Se me perguntares
De que cor é a tua pele
Direi apenas que ela é
A reunião de todos os lírios do vale
-
E a tua alma
Nunca pergunte sobre ela
A mim, tua pobre serva
Porque não há palavras
Suficientes neste mundo
Para descrevê-la.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Orfeu longínquo

Orfeu longínquo
-
Ofélia vai derramar aqui
Através de seus versos,
as lágrimas que, pelo seu rosto,
Não podem escorrer
Porque ela choraria um mar
Poderia alagar o vasto sertão
-
E por algo tão efêmero
A distância
Seu Orfeu está longe
Em paragens desconhecidas
-
Ofélia está doente
Doente de amar,
falta-lhe o ar
A angústia invade-lhe a alma
Sim, Ofélia padece
-
Seu sangue foi roubado
Pelo amor,
esse anjo vampírico,
Que cravou-lhe os dentes
impiedosa e selvagemente
-
O amor sangrou-lhe,
Por que o amor é um deus indômito
Um deus incontrolável que bebe sangue
E que exige a seiva rubra da vida
Sempre em seu altar
-
Ofélia, acorrentada e prisioneira
Da vassalagem amorosa que lhe assalta
Ela deseja derrubar-se aos pés de Orfeu
Beijar-lhe todo o corpo desnudo
Vasculhar-lhe a alma...
-
Ah, Ofélia!
Dama que tem seu amor
Fadado ao fracasso
Ofélia banhada em pétalas de rosas mortas
-
Mas sossega-te, ó coração em agonia
Deixa a paz invadir-lhe o âmago
Porque Orfeu volta, nem que seja na última hora
Nem que seja para olhar-te nos ohos no adeus final.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

O Monólogo de Ofélia

O Monólogo de Ofélia

As rosas derramam o perfume na Primavera

Tal qual o javali derrama seu sangue ao leão

Tal qual Ofélia derrama suas palavras na poesia

E seu amor a Orfeu

Orfeu, a mais brilhante e distante estrela

do céu em água, repleto de flores, dela

O céu em água, céu em morte de Ofélia

Céu visível unicamente através das flores

Céu das flores, por final

Céu sem amores, afinal

Apenas com Orfeu

Orfeu, com sua alma e seu corpo,

Faz-me sentir ainda mais a capacidade de ser Ofélia

Ofélia menos Orfeu, há paradoxo mais real

Orfeu meu sentimento, razão e loucura

Orfeu, minha prisão e liberdade

Então, apenas vá embora, Orfeu

Toca tua lira longe de mim

E liberta-me, assim, para amar-te.

por Ofélia Imortal